sexta-feira, 8 de julho de 2016

Um livro Submerso

Acabei de ler um livro diferente. Da editora Darkside Books, cujo trabalho de editoração é impecável, mas não me atrai pelo seu catálogo (muitas adaptações de filmes B e séries de fantasias “volumétricas” a rodo).
O livro é A Menina Submersa - Memórias, cuja autora, Caitlín R. Kiernan, foi ganhadora do prestigiado prêmio Bram Stoker.
Cheguei a ele ao pesquisar sobre um ensaio de Ursula K. Le Guin, pois o Google Books me levou a uma página do livro em que esse ensaio é citado pela narradora.
A narradora - India Morgan Phelps (Imp, “diabrete”) - tenta passar para o papel episódios de sua vida que se perderam em meio a crises psicóticas . Isso é entremeado a um passado familiar trágico, a histórias de contos de fadas que são fantasmas, a assombrações, histórias vívidas e reais naquele universo. E arte, muita arte.
E o universo da obra é rico, nos emociona, “verídico e factual”, apesar de as múltiplas vozes de Imp nos enganar, e se enganar também.
(O livro me transportou a outro, Fernanflor, sobre o qual também postarei).
A narrativa não é linear, e isso apenas torna a obra mais rica. Estamos na mente da narradora, e os acontecimentos são recortados com histórias do seu passado e outras que ela descobre ao tentar montar um quebra-cabeças de um período em que esteve em frangalhos.
O estilo da autora é fluido, lírico, mas por vezes senti uma forçação de barra atribuir a Imp um conhecimento enciclopédico sem lastro (o da autora é vasto, eu soube depois).
É uma obra de fantasia, de fantasmas, daquilo que habita nossa mente e pode, sem aviso, tentar nos devorar. Os admiradores de HP Lovecraft vão se identificar com muitas passagens. Uma das tramas paralelas que Imp tenta desvendar é bem lovecraftiana, pois diz respeito a um culto a “poderes submersos” (não quero falar mais, senão estrago).
As referências da autora são muitas, não se resumindo ao autor dos mitos de Cthulhu. Joseph Conrad, Herman Melville, Albert Perrault, Neil Gaiman e outros.
Vale a leitura.

Em tempo, a tradução foi feita por duas pessoas, mas, só para exemplificar, há erros básicos: em um momento, Imp (que usa uma máquina datilográfica), reclama de dores nas mãos e o texto aponta que “essas chaves são grudentas e precisam de óleo” - quando deveria se referir a teclas (que também é keys); em outro momento, Imp diz que esmurrou sua namorada e a deixou com um olho preto, mas o equivalente de black eye em português é “olho roxo”. Bom, sou chato pra atento a essas coisas, fazer o quê? A tradução, fora é isso, é massa, muito competente.

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