quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Burgogui

Hoje estivo no Burgogui, restaurante Coreano que fica no Espinheiro, perto da Rua da Hora.

O ambiente é familiar, simples, com cartazes publicitários de Quiro Acupuntura do Dr. Choi. Os garçons são didatas de primeira, a família dona do local vai conversar com você, explicar como melhor comer os pratos servidos e perguntar se está tudo certo, ok?, obrigado!

Comemos um prato chamado Burgogui.

Contrafilé marinado servido grelhado na própria mesa (em um fogareiro coreano a gás) e com diversos acompanhamentos - amendoim caramelado; batata caramelada; broto de feijão; um creme de soja parecido com tahine; arroz à moda oriental, daqueles grudadinhos e azedinhos; um fermentado de acelga e cenoura em tirinhas bem apimentado (kim-chi).

A sugestão para comermos era por a mão na massa. Usar o hashi para pegar os ingredientes e colocar as opções desejadas sobre uma folha de alface e fazer uma pequena trouxinha. Que experiência sensorial! Cada mordida era uma explosão de sabores, e a soja predominava: a carne era grelhada e acompanhava um caldo de carne que leava soja; o amendoim e a batata eram caramelizados em um molho teriaki, que tem soja em sua base; havia o "tahine" de soja; o arroz, no fim, era servido com o caldo de soja da carne, e a experiência ficava completa de uma maneira literal - a comida acabou e o estômago estufou...

No fim, um chá verde para a digestão, e a promessa de voltar e conhecer as demais delícias - deu vontade de levar o cardápio para casa.

* foto de Alexandre Belém

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Banquete neo-búlgaro












A FreePorto começa hoje e eu não estarei lá. Nada de farra, era para eu estar lá a trabalho, mas uma gripe (38º C) me deixou arriado e mole de coração selvagem.


Mas tenho de falar sobre o Banquete realizado no Banquete (Rua do Lima) em homenagem à Nova Bulgária. A Raposa aportou de suas desvairadas aventuras para nos brindar com as receitas trazidas d'lá do rio.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Atum grelhado ao molho tartare rouge

O último sábado foi um dia de compras e experimentação.


Tudo em nome do romance.


Arrisquei-me novamente na cozinha para o preparo de um prato nunca antes feito (não nesta encarnação).


Peguei uma receita do Claude Troigros (um mestre da simpatia e da culinária), mas fiz pequenas adaptações.


Aqui disponho a receita didaticamente, no estilo do Menu Confiança, pois esse foi um jeito simples e eficiente de acompanhar o passo-a-passo da realização.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

"Um Banquete para a Nova Bulgária"



A FreePorto convida, e eu repasso. Ah, a reserva tem de ser feita. O valor é de R$ 35,00 por pessoa e a casa aceita cartões.


Amigos!

Como parte das ações da FreePorto e das provocações neobúlgaras, estamos organizando no Restaurante Banquete, na Rua do Lima, um menu de degustação da Nova Bulgária.

Durante a degustação nós, do Urros, contaremos a 'história' de cada prato, criada também a partir dos sabores que os chefs do Banquente nos brindaram com suas criações originais. Quem quiser fazer as reservas, telefone para o Banquete que eles dão mais informações.

Será a única oportunidade de provarem os sabores desse maravilhoso país: um menu pensado exclusivamente a partir do universo que todos vocês estão ajudando a criar. Só haverá espaço para 30 pessoas, então, façam suas reservas. Abaixo segue o release.

Esperamos vocês por lá! 

Wellington de Melo

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Um banquete para a Nova Bulgária
FreePorto inventa culinária de seu país imaginário e convida leitores e escritores para degustá-la
 
Levando a outro patamar a ideia de misturar literatura e gastronomia, a organização da FreePorto, em parceria com o restaurante Banquete promove, no dia 23/11 um menu de degustação do país imaginário criado pelo grupo Urros Masculinos para a festa literária, que acontece entre os dias 3 e 5 de dezembro. A proposta da FreePorto deste ano é misturar realidade e ficção, tomando como inspiração o livro O púcaro búlgaro, do escritor mineiro Campos de Carvalho, que é homenageado da festa. O grupo Urros Masculinos (Artur Rogério, Bruno Piffardini e Wellington de Melo) rebatizou o Bairro do Recife de Nova Bulgária, dividiu o país em 13 províncias e convidou escritores para compor um governo imaginário. Entre os nomes de 'governadores' estão escritores como Marcelino Freire, Ronaldo Correia de Brito, Raimundo Carrero e Lucila Nogueira. "A ideia foi criar uma república anti-platônica. Como Platão colocou os poetas para fora de sua República, colocamos para dentro de novo!", explica Bruno Piffardini.
 
MENU NEOBÚLGARO - A ação no Espaço Cultural Banquete foi feita pelos membros do Urros e os chefs João Salles, Renan Yamashita, Renata Oliveira e Jonas Figueiredo. A ideia foi criar um menu de degustação com quatro pratos inspirados no universo da Nova Bulgária, homenageando as províncias neobúlgaras. Os gourmets de plantão poderão provar, essa única vez, um menu contemporâneo criado exclusivamente para o evento e que terá sua 'história' criada pelos integrantes do Urros. "Queremos misturar, efetivamente, literatura e gastronomia, criando uma história para cada prato a partir do sabor que eles nos proporcionam e que, por sua vez foram criados a partir de nosso universo ficcional. Intersemiose total!", esclarece Wellington de Melo. As reservas devem ser feitas com antecedência. No dia do menu estarão expostos cartazes com a história de cada prato do menu.
 
SERVIÇO:
Um banquete para a Nova Bulgária
DATA: 23/11
LOCAL: Restaurante Banquete, Rua do Lima, 195 - Santo Amaro
RESERVAS: 3423-9427

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

"A arte de cozinhar" 01

Semana passada estive em uma simpática casa. Lá é a sede do Instituto Sois – uma ONG de ajuda humanitária que se preocupa em ensinar além de salvar. À noite, de quinta a sábado, funciona, no espaço, o restaurante conhecido como Kovacic. É por meio da renda do restaurante que o múltiplo Cláudio Kovacic financia seus projetos sociais.

[O restaurante é um espaço alternativo, não no sentido pós-moderno, e sim porque parece fora da realidade... (temo que o post sobre a degustação dos pratos e as errâncias culinárias ficará para depois, porque, creio, voltarei lá em breve – a reserva já foi feita)]

Cláudio encontrou uma maneira de homenagear as pessoas que são importantes para o Instituto Sois: elaborou um cardápio elaborado em Sete Dons Divinos.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Por trás dos muros (01)

No fim de semana passado, estive em um café e em um bistrot que, creio, se valorizam e se vendem pelo clima intimista e pela boa culinária.


Ambos ficam em Casa Forte, a menos de quinhentos metros um do outro.


O primeiro é o Provence, fica pouco antes das Ubaias, em direção a Apipucos. Uma casa bonita, e simples, difícil de ser identificada porque não há placa (e a Prefeitura restringiu esse tipo de sinalização), mas sim estratégicas mesas bem iluminadas em uma varanda que dá para a calçada. A iluminação é um destaque. O ambiente é quase todo em tons bege e creme, com toque de marrom escuro, para chamar atenção às guloseimas expostas na parte interna da casa. Lá, após uma pequena porta, há um espaço para recreação infantil, com videogame e uma gigantesca televisão LCD, a fim de que os rebentos possam deixar os pais em um momento mais romântico.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Tempero vivo

Fui ao Ostreiro, em Boa Viagem, com uma amiga. Queríamos tomar um bom chopp e discutir relações que não a nossa.

Passamos por um aquário - destaco a limpeza e a renovação constante do oxigênio - repleto de ostras. "Hmmm, bom, faz tempo que não como ostras, hein?", pensei. Ora, estava no O-s-t-r-e-i-r-o, era dia de aproveitar.

Começamos pelo chopp, que não nos decepcionou.

O cardápio, com visualização rápida, nos efereceu inúmeros quitutes oceânicos. O primeiro, uma casquinha de caranguejo. Casquinha não. Justiça seja feita, a porção é servida dentro de uma conha de vieira (pensou no símbolo da Shell, acertou). Delícia. Não sei como se prepara, mas os temperos estavam excelentes. Picante na medida certa.

Enquanto eu estava ao telefone com Adriana (um dos seis seguidores deste blog), chegaram as ostras. Atendimento personalizado, um rapaz com luva de aço inoxidável, faca com lâmina apropriada para abrir as conchas, limão em punho. Perfeito. As ostras estavam frescas, retorciam-se com a aplicação do limão, mas o ostreiro - o dito cujo do rapaz com mão de aço - insistia em aplicar sal na minha ostra. Não, caro colega, para mim é sem sal.

De imediato senti a diferença. O sal, em uma ostra que já vem de um tanque de água salgada, reforça na ostra um gosto de maresia que, creio, você não vai querer sentir.

Tudo bem, pus umas gotinhas de pimenta para aplacar a dor.

Chegou o arremate: um púcaro repleto de Sururu ao Coco. Delicioso. O dendê estava no ponto, o cominho era uma levíssima lembrança, e o sururu foi muito bem tratado. A nota dissonante foi o coentro. Muito coentro é como uma pessoa interessante e atraente que começa a grudar em você...

Fomos muito bem atendidos no Ostreiro. Os garçons são muito atenciosos, sempre a postos e com boas sugestões. A decoração é bonita, mas segue o padrão "Boteco way of bar" (bom, não sei se os donos são os mesmos); a música e os comensais são, definitivamente, do padrão "Pagode Universitário". 

Preparar uma boa comida com temperos simples é um desafio, uma arte a ser dominada. Sal e pimenta-do-reino (quer coisa mais básica) "a gosto" é uma particularidade de quem cozinha. A medida está na mão do cozinheiro, a sensibilidade em seu paladar e olfato. Gosto todos temos. Sei que há pessoas que adoram um prato abarrotado de coentro, cominho, alho etc. A diferença está, como dito há pouco, na sensibilidade, no desenvolvimento desses sentidos tão ligados à boa mesa. Há sempre um momento de dizer "chega".

(outra nota dissonante, que arrematou com bom humor aquela noite: minha amiga tomou um susto quando viu uma ostra se mexer dentro do aquário. "Elas estão vivas?")

sábado, 30 de outubro de 2010

Hamburguer ilhado

Uma de minhas melhores lembranças da infância é ter saído do show do Legião Urbana no Geraldão e ir com meu primo Nando e minha irmã Silvinha ao Ilha Burger, na Antônio Falcão.


Pois bem, eu tenho ido correr na praia e noto que a movimentação na dita cuja hamburgueria é alta e constante (sou quase vizinho).


Lá levei, há quinze dias, minha mãe e minha pitéu Valentina. Como já disse, passo por lá sempre, mas não pisava dentro do estabelecimento desde 1992. Para a pequena, pedi um cheeseburger simples, sem verdura, sem molho etc. e um suco de uva. Minha mãe tomou apenas uma coca-cola, e eu pedi um hamburger de calabresa, com molho de hortelã e abacaxi gratinado.


Éramos os únicos clientes no momento.


Foi lamentável.


O caixa, apesar de uma simpatia, me pareceu bastante enrolado. O chapeiro demorou mais de cinco minutos para aparecer e preparar os pedidos. O suco de uva estava amargo, não tinha gosto nem de Frutare e meu suco de mangaba lembrava qualquer coisa, menos a fruta.


Quando os sanduíches chegaram, vi logo que o da minha filha estava com alface, tomate, e uma exagerada dose de maionese. O meu sanduíche, muito gorduroso, também nadava em maionese (era uma vez molho de hortelã).


A única coisa notável é que a carne do hamburger de Valentina (é claro que eu experimentei) tinha um leve gosto defumado. O cozinheiro não usava um daqueles utensílios para pressionar a carne na chapa, mas sim um abafador, o que conferiu um sabor de churrasco à carne.


A Nostalgia muitas vezes vem carregada de ilusão. Tais momentos são irrepetíveis. Repatriar a memória é como trazer alguém do exílio: há assuntos que não devem ser mencionados.


O diletantismo tem dessas coisas. Sem técnica, mas aspirando a um constante aprendizado, sem conhecimento, mas com uma cultura geral bem encorpada, as (re)descobertas nos levam a insólitos caminhos. Temos de enfrentá-los sempre.


Ele diz: "Estou de olho!"

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Omelete #001



Uma omelete de galinha com cream cheese.


Ingredientes:


Peito de frango, coxa ou sobrecoxa;


02 ovos em temperatura ambiente e levemente batidos;


Molho shoyo;


Limão a gosto


01 colher de sopa exagerada de cream cheese;


01 colher de sopa de milho;


02 rodelas de tomate, sem semente;


Preparo: Desfiar o frango e regar com molho shoyo; colocar umas gotas de limão; bater os ovos e, em uma frigideira plana e antiaderente, passar um pouco de manteiga. Recomendo fogo médio. Após colocar os ovos, esperar que estes fiquem consistentes e cozidos para inserir os ingredientes. Depois de adicionar a galinha (sem o excesso do shoyo), por o milho e o cream cheese; acrescentar o tomate e dobrar a omelete (feminino!).


Recomendações: pimenta do reino a gosto; salsinha ou orégano (se quiser um sabor mais forte, mas com comprometimento da harmonização dos ingredientes). Após derramar os ovos, com uma espátula direcione as bordas já cozidas para dentro, a fim de que o cozimento se dê mais rápido. Para dobrar a omelete, bata de leve na frigideira para ela se soltar, incline a frigideira e deixe a omelete escorregar, usando a gravidade para ajudar a realizar a dobra.


Eu não usei sal quando fiz a minha. O shoyo foi suficiente. O tomate deixou a omelete bem suculenta, e o milho e o cream cheese me surpreenderam pela harmização com a galinha.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

"Onde quer que seja"

Estive recentemente no Varekai, que não é mais Bistrô, e sim Café.


Apesar de todos os meus conhecidos terem ido quando a casa ainda estava na Galeria Joana D'Arc, sinto que o intimismo foi preservado, mesmo com a mudança para o local onde antes habitava o Da Noi, mais espaçoso, e mais caro ($$$).


A decoração privilegia a peregrinação feita pelo chef Thiago Arnaud em sua constante formação. Paisagens asiáticas, do leste europeu, norte da África e da Península Ibérica.


A recomendação dos amigos comensais foi expressa: Menu Confiança. Mas o Errante Diletante aqui não sabia que deveria ter reservado com antecedência.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

"Eu ando pelo mundo prestanto atenção..."

 Ou não!


Será esse o espírito d'O Diletante?


Cores das quais não sei o nome; pratos deliciosos, frutos de uma petrificante alquimia, eles dizem: "Decifra-me para me devorar".


I'm a scavenger and I shall prevail.


Bem-vindo!


E, qualquer coisa, pergunte ao pó!



terça-feira, 20 de julho de 2010

Feliz Dia do Amigo


Aos meus querido(a)s amigo(a)s, uma grande beijo e um grande abraço neste dia.

Fiquem aqui com frases sobre a amizade:

"A amizade é um contrato segundo o qual nos comprometemos a prestar pequenos favores para que no-los retribuam com grandes" (Montesquieu).

"A amizade é um comércio desinteressado entre semelhantes" (Oliver Goldsmith)

"Só os solitários conhecem a alegria da amizade. Outros têm suas famílias, mas só para um solitário e um exilado os amigos são tudo" (Warren G. Harding)

"A confidência corrompe a amizade, muito contato a consome, o respeito a conserva" (Cícero)

"Amizades são coisas frágeis, e requerem muito mais cuidado que todas as outras coisas frágeis que existem" (Randolph S. Bourne)

"O amigo tem que ser como o dinheiro, que antes de necessitá-lo, sabe-se o valor que têm" (Sócrates)

"A única recompensa da virtude é a própria virtude. O único modo de ter um amigo é ser um" (Ralph Waldo Emerson)

Por fim, a frase mais antiga sobre amizade que eu conheço (mas não sei de quem é):

"Um irmão é um amigo que nos foi imposto pela natureza; um amigo é um irmão escolhido por nós"

domingo, 20 de junho de 2010

Vodca e Literatura em um conto de Artur Lins

Este conto, Na Zdorovye, foi publicado no blog do Urros Masculinos em 2010. O link é este, mas você pode ler o conto aqui:

NA ZDOROVYE*

Sou chamado às claras por uma tontura persistente. Estou a três centímetros do travesseiro. O cobertor está engomado e dobrado ao meu lado. Minha bunda aponta para cima; minhas pernas, curvadas até a altura da barriga, e minhas costas oferecem uma pista de pouso para mosquitos indesejáveis.

Faz frio, muito frio, mas o que o corpo percebe a mente não quer processar. Sinto apenas o fedor etílico entornar por todo o quarto.

O braço tateia para os lados e de repente parece uma mangueira sem controle: dormente.

Estico as pernas e desabrocho em minha cama. Pego o lençol com a outra mão e faço do meu canto um sarcófago, enrolado como uma múmia. (A esperança de um sono tranqüilo cede à necessidade de um mijo insistente)

… que não quer parar e pinta o chão com a cor do sol. Bom, pinho sol amanhã de manhã. Não sei se tenho, mas vê lá, quem sabe?

Volto e penso naquela bundinha empinada… não, estou só. Delirante, companheiro. Que a vodka desperte em ti a pujança de um ardor ancestral no céu da boca. Só as de péssima qualidade. Deitada, arrepiada, tremendo de frio… e eu só olhando. A carne na cama. A vodka no congelador. Mas eu tô com frio. E ela não está lá. Já foi, não sei. Foi quando?, passou. Entornei de repente…

Eu sento. E só percebo a madeira embaixo de mim quando me deito. O corredor se fez notar em sua nuance familiar. Por esse ângulo demorou, mas nada que vinte anos de convivência imobiliária não resolvam.

Ficarei aqui, prostrado. Intitularei este momento “a razão de não voltar pra cama”. Ela não está lá.

(* saúde em russo)

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Fábio Saito, um médico sem fronteiras


Meu amigo do colégio Fábio Saito está no Congo, na "República Democrática do Congo", antigo Zaire.

Fábio já esteve antes na África. Passou quase um ano viajando pelo continente e conhecendo, como um mochileiro, a realidade daquela terra.

Ele foi detido por autoridades locais, tirou belas fotos, conheceu um povo simpático e melancólico, passou por terras em conflito e voltou ao Brasil.

Fábio é formado em Medicina pela UFPE, é mestre em Infectologia (passou muito tempo na Amazônia, mas isso é outra história) e foi médico de Saúde Familiar em diversas cidades do interior brasileiro. Sua meta: juntar dinheiro e voltar à África.

Lembro-me quando éramos do primeiro ano científico (hoje Ensíno Médio) e, juntos, na cantina, Fábio disse a mim e a outro amigo que queria ser um médico sem fronteira. E eu lá sabia o que era isso.

Ele foi aceito na Médicins Sans Frontières (página oficial aqui) e, no início do ano, foi à Bélgica para um briefing, pois seria enviado ao Congo Belga. É na vila de Niangara, no nordeste do país, onde ele exerce sua profissão, em uma cidade rodeada pela guerra civil, um lugar que é um asilo para os refugiados e feridos das batalhas.

Aqui está um relato, do proprio FS, sobre o local:

"A vila é no meio do nada, na beira de um rio, e nao tem televisao, cerveja (e nenhuma bebida alcoolica nem nenhum produto industrializado!!), eletricidade, coca cola, estradas ou internet. so tem um carro na cidade, q chegou depois de dois dias num projeto de caminho da cidade mais proxima, a uns 120km. imagina a estrada como é boa. o msf tem um gerador la e se manda email de vez em quando (mas nao tem internet pra navegar) por um BGAN (um aparelho q fica conectado por satelite). entao pode ser q demore um bom tempo ate eu mandar um email. a conexao é bem ruim. la o hospital é completamente isolado, nao tem quase nada de equipamento e nao tem pra onde transportar os pacientes. nao tem outros medicos. entao ou se resolve as coisas ou se deixa acontecer. da um pouco de medo. o lugar é infestado de malaria, doenca do sono, peste (inclusive pneumoica), oncocercose e tem 25.000 refugiados de guerra pq tem conflitos todas as semanas nos arredores (mas nunca la). o problema é o grupo ugandense LRA q atua na regiao e comete uns crimes (uns 3 ou 4 por semana). mas o msf é otimo e mt organizado. eles têm meio mundo de gente das "logistica" trabalhando para evacuar a gente caso exista a minima possibilidade de um ataque na nossa cidade. tem varios planos de evacuacao e tudo. Acho q vai ser uma otima missao."

Fábio me enviou muitas fotos. Algumas eu exponho aqui.

Um grande abraço, Fábio. Espero que você volte logo.


sábado, 5 de junho de 2010

O Profeta de pés descalços

(Não leia se você não viu)

Há tempos um roteiro cinematográfico não conta tão bem a história da ascensão de um chefe do crime organizado. E de forma original. O Profeta, do diretor Jacques Audiard (e co-roteirizado por Thomas Bidegain), faz um paralelo entre a vida do último profeta islâmico Maomé e de Malik El Djebena (Tahar Rahim), jovem de dezenove anos condenado a passar seus próximos seis anos em uma prisão dominada pela máfia corsa.

Malik tem de, primeiramente, sobreviver. E, para isso, deve se associar a um dos grupos dominantes: os corsos ou os árabes. O fato de Malik ser árabe não resolve simplesmente a equação. Ele quer ficar só, quer vencer nos seus termos, mas tem seus tênis roubados no primeiro dia em que sai para o pátio. O líder dos corsos, César Luciani (interpretado por Niels Arestrup, que roubou a cena), aproveita-se dessa fragilidade de Malik para usar o novato em um dos seus esquemas de guerra, o assassinato de um árabe rival.

Além de tentar sobreviver sendo escorraçado pelos mafiosos de César, Malik também é confrontado pela falta de identidade étnica. É descendente de árabe, falava esta língua e o francês, mas não sabe qual é sua língua materna, pois sua mãe é a oportunidade. Aprende italiano observando os corsos, porém é levado a entender que isso não importa, ele nunca será um mafioso, e sim um serviçal.

César, por uma questão política, vê seus aliados saírem da prisão. Esvaziado de poder, tem em Malik uma fonte para ideias e um alívio para a necessidade de impor sua autoridade.

Malik percebe que o futuro é a prisão, pelo menos o porvir, e é lá onde ele deve buscar ajuda. É lá onde ele aprende a usar os outros para obtenção do que almeja.

E talvez seja aí que o elemento fantástico (ou esquizoide) do filme aparece. Reyeb (Hichem Yacoubi), o preso morto por Malik, vem atormentá-lo do além. Ele é a ponte entre a jornada de Malik e a do profeta Maomé. É o Anjo Gabriel, traz a Palavra e o Fogo. É o único companheiro de Malik em sua solitária senda.

Maomé foi escorraçado ao abandonar o culto politeísta e ter passado a pregar o monoteísmo. Congregou uma comunidade de nômades unida apenas pelo idioma e pelos costumes mercantis. Casou-se com uma viúva e conquistou seus rivais. Era um grande comerciante e, impulsionado pelo seu natural interesse religioso, tornou-se um formidável pregador.

Audiard deixa claro que a palavra é um manancial para o poder, o despertar do intelecto. A partir do momento em que Malik aprende a escrever, anuncia ter o domínio de si próprio, mas não teme em dizer que faz o que é mandado. Ele se torna um mafioso em seus próprios termos, individualista, porém ciente de que esse jogo é um jogo de trocas, de alianças e respeito velado. Apenas quando ele se aproxima de pessoas que não estão no círculo de Luciani, como o Cigano (Redá Kateb) e o árabe Ryad (Adel Bencherif), o qual chama Malik de irmão (na antológica cena final, Audiard deixa claro que a família ainda é o alicerce e o ponto fraco do mafioso), é que o protagonista encontra outros meios para a sobrevivência.

A história valeu-se do gênio de Audiard por trás das câmeras, sempre perto do protagonista, testemunhando seus dramas e conquistas. O filme é dividido em atos apresentados através do que parece um buraco de fechadura. Apesar de longo, duas horas e meia de duração, o filme se sustenta sem entediar o expectador. As cenas de ação – cruas, mas não exageradas – são o ápice de uma tensão que vem sendo construída e pontuada pela trilha sonora de Alexandre Desplat (que aparece em poucos momentos), marcada pela ágil e perspicaz edição de Juliette Welfing (bem interessantes são as cenas onde Malik passa a ser os olhos e ouvidos de César, ou quando são mostradas as formas dos contrabandos entrarem na prisão, ou mesmo nas precisas cenas de ação).

O Profeta não é um filme de redenção. Se Malik é um garoto frágil e com olhar medroso ao entrar na prisão, com o passar do tempo ele apenas se torna um criminoso pior, ciente dos seus atos e do que é necessário fazer para “vencer”.

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Branca de Neve e Neil Gaiman


Que fascínio oculto reside por trás dos contos de fadas? Para as crianças, entrar em contato com criaturas fantásticas, fantasia, universos imponderáveis que poderiam ser o nosso, pois os petizes ainda não estão limitados pelas leis da física. Aos adultos, estudar questões psicológicas; antropológicas; históricas; e, creio eu, o processo criativo dos textos, suas muitas versões e a passagem de contos aterrorizantes a produtos embalados da Disney.

Atento a isso, Neil Gaiman confessou que leu inúmeras versões de Branca de Neve, mas ele não se deu por satisfeito. Gaiman é conhecido por ser um excelente recontador de histórias. Creio que tenha sido isso que o impulsionou a escrever sua versão desse conto.

Entitulado Neve, Vidro e Maçãs, o texto nos é narrado pela conhecida Rainha Má e, pasmem, esse título não lhe pertence. Sob seu ponto de vista, Branca de Neve é uma criatura dissimulada, incestuosa, sobrenatural. A Rainha se apresenta como uma estadista, preocupada com seu reino e com as nuvens negras que pairam sobre a cabeça de sua enteada. Os duendes estão no texto e, longe dos gnomos simpáticos que "vão para casa", são as criaturas das profundezas, saídas dos mitos escandinavos. Gaiman força um pouco a barra ao utilizar doses psicanalíticas para tentar explicar a reação do Príncipe no fim do texto, mas, confesso, esse é a melhor versão que já li desse conto.

O texto está disponibilizado gratuitamente, em inglês, e com autorização do autor, aqui.
Em sua versão impressa, pode ser encontrado no livro Fumaça e Espelhos, já nas livrarias.