quarta-feira, 21 de junho de 2023

Certeza sobre o fim, incertezas quanto à vida de leitor

 O livro, a história, o enredo, a danação veloz na hora da leitura.

Cada vez menos uso a antiga régua de "li tantos livros" para medir minha paixão pela literatura.

Tardiamente, apenas após quarenta voltas ao redor do sol, em espiral cortante pelo cosmos, percebo que vale mais para mim apreciar a obra de arte a que me propus desvelar do que contabilizar o li ou não li, o vi ou não vi (porque também me considero cinéfilo).

Para uma síntese: deixei de ser um nerd abestalhado, que queria ver e ler tudo, e passei a ler mais devagar, para apreciar a obra, e a continuar a ler e ver apenas se a obra é interessante para mim, e não pela obrigação de se chegar ao fim.

O que acham disso?

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2023

Impressões sangrentas sobre Seja Imortal, de Frederico Toscano



Fazia tempos que eu procurava um livro sobre/com vampiros que não se prendesse às questões melancólicas, às formas de sua destruição, ao sangue dos e das virgens - enfim, que fugisse aos clichês. Há sim essas questões, mas elas são menor ao enredo de Seja Imortal (Frederico Toscano, edição digital do autor) e são, ainda assim, constitutivas dele.

Não que Seja Imortal não nos traga uma familiaridade com o mito e suas diversas lendas, mas, se você procura os vampiros de Anne Rice, John Carpenter e Bram Stoker, vá diretamente nessas fontes. Os vampiros de Frederico Toscano estão mais próximos, para mim, dos de Stephen King em Salem's Lot (pela natureza), também presentes na saga A Torre Negra (em que há também uma questão corporativa).

Como suportar o jugo de viver para sempre, mas sem hormônios para regular nosso corpo, tendo de fugir do sol, de turbas ensandecidas etc. Bom, isso aqui não é um ensaio, mas vamos lá.

O livro conta a história de Eudora, mulher negra, portadora de deficiência física, e um gênio no seu campo de trabalho. Enquanto progride na carreira, chama atenção dos executivos vampirescos de uma empresa milenar que se instalou no Brasil - lugar, aliás, em que os imortais resolveram se revelar ao mundo. De sua cultura, eles trouxeram nomes, históricos ou não, lastreados na Grécia Antiga e até mesmo em mitos ainda mais antigos.

Voltando à natureza vampiresca, é impressionante como Frederico Toscano conseguiu nos mostrar diversas agendas dos vampiros e, no final, a síntese de todas elas, uma apoteose que volta ao início, como o dragão mordendo a própria cauda (mordendo de verdade, no pun intended) - mas deixarei para o leitor chegar nesse ponto.

O livro é imenso, super bem escrito, muito bem pesquisado (bom, o autor é mestre e doutor em História, convenhamos) e vai revelar ao leitor belas surpresas. Pra mim, houve aquele impacto de não querer largar o livro, mas, como tenho outras leituras, o momento de ler Seja Imortal geralmente era após às 22h, na cama, o ambiente escuro... Seja Corajoso hehehe.

O livro fala de abusos. Abusos políticos, individuais, coletivos. Fala de um país fraturado e dominado pela elite financeira. Fala também de resistência, independentemente do poder das elites. É um convite para a ação em meio à opressão. Senti ecos de leituras minhas anteriores: 1984, Admirável Mundo Novo (Soma neste; Ambrosia e o Elixir em Seja Imortal); A Rainha dos Condenados (da Anne Rice, mas ruim), Fahrenheit 451, e até de Assassin's Creed Odissey (só quem se apaixonou por Kassandra e sua jornada sabe...).

Bom, espero que venham continuações ou outras histórias no mesmo universo. Serão muito bem vindas.


* O livro é uma edição do autor, então possui pequenos erros que não passariam em uma revisão, mas nada que comprometa a leitura. Quero que essa obra caia logo no radar das editoras, merece muito uma edição física.